sexta-feira, 16 de julho de 2010

CONTROVÉRSIAS EM ELETROCARDIOGRAFIA II: O BLOQUEIO DIVISIONAL ANTEROMEDIAL

O saudoso Dr. Eneas Ferreira Carneiro dedica mais de 3 páginas do seu livro de Eletrocardiografia a discussão do bloqueio divisional anteromedial, concluindo que não haver evidência para a caracterização com precisão do bloqueio anteromedial (BDAM).
Passado mais de 20 anos a controvérsia persiste, não havendo unanimidade na literatura médica a respeito dos critérios eletrocardiográficos, com opiniões divergentes entre os autores. A escola americana em geral dá pouca importância a este distúrbio de condução, que em geral denomina bloqueio fascicular septal ou médio-septal. Por exemplo, o livro de Marriott (Marriott’s Practical Eletrocardiography, 8 th edition, 2008) não trata deste distúrbio de condução. Outros dedicam poucas linhas, em geral destacando o aspecto controverso dos critérios e a dificuldade para caracterizar este bloqueio fascicular.
A existência do fascículo septal ou anteromedial é geralmente aceita, sendo formado por fibras que se intercruzam na região central, embora muitas variações anatômicas exista no sistema de condução. Assim, o ramo esquerdo é formado por 3 fascículos: anterior, posterior e o septal (ou anteromedial). A controvérsia principal consiste na caracterização do bloqueio anteromedial no ECG (critérios). Baseado na falta de aceitação universal dos critérios, as recomendações da AHA/ACCF/HRS de 2009 (AHA/ACCF/HRS Recommendations for the Standardization and Interpretation of the Electrocardiogram) não endossam o uso do termo bloqueio fascicular septal e sequer cita os critérios para este distúrbio de condução.
Entre os autores que defendem a caracterização do bloqueio fascicular septal podemos citar o Dr. Rex MacAlpin (Division of Cardiology, 10833 Le Conte Ave, Los Angeles, CA) e a escola de Eletrocardiografia do Incor-SP, desde os trabalhos de Dr. João Tranchesi. O grupo do Incor tem descrito através de trabalhos a caracterização do BDAM: alterações eletrocardiográficas, no vetocardiograma e no mapa de ativação endocárdica. A diretriz brasileira (Diretriz da Sociedade Brasileira de Cardiologia sobre Análise e Emissão de Laudos Eletrocardiográficos de 2009), editada por Dr. Carlos Alberto Pastore, do Incor-SP cita os critérios para o diagnóstico do BDAM. Estes critérios não têm unanimidade nem mesmo entre os autores que aceitam e difundem o BDAM, com diferenças significativas entre os mesmos, como podemos ver na diretriz citada e nas referências seguintes: MacAlpin RN (left fascicular block: myth or reality? Indian Pacing Electrophysiol. J. 2003;3(3):157; acesso-http://cogprints.org/4280/1/macalpin.htm), Riera ARP et al. The History of Left Septal Fascicular Block: Chronological Considerations of a Reality Yet to be Universally Accepted. Indian Pacing and Electrophysiology Journal, 8(2): 114-128 (2008); acesso-http://www.ipej.org/0802/riera2.pdf).
De modo resumido, o padrão eletrocardiográfico do BDAM resulta do deslocamento da alça vetocardiográfica, produzindo amplas ondas R nas derivações precordiais V1-V2 e nas precordiais médias. Devem-se excluir outras causas de R ampla nestas derivações como BRD, infarto dorsal e hipertrofia ventricular direita.
Tal como no passado a controvérsia a respeito da caracterização do BDAM ou bloqueio fascicular septal ainda deverá continuar.

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