terça-feira, 15 de março de 2011

CANALOPATIAS I: SÍNDROME DE BRUGADA

(Aspecto eletrocardiográfico normal (A) e típico de Brugada (tipo 1)(B).Figura da Wikimedia Commons, autor: J. Heuser). O padrão tipo 1 está bem representado em V2 (seta).


As canalopatias são condições causadas por disfunções nos canais iônicos. Sabemos que o fluxo de íons através dos canais iônicos é fundamental para a atividade elétrica e funcionamento da célula cardíaca.
A síndrome de Brugada, a síndrome do QT longo congênito e a síndrome do QT curto são exemplos de canalopatias.
São condições determinadas geneticamente, de caráter familiar.
O Eletrocardiograma desempenha papel de destaque no diagnóstico destas condições que são associadas com risco elevado de morte súbita. Em geral os portadores apresentam coração estruturalmente normal. Assim exames como radiografia de tórax e ecocardiograma são normais nestas condições.
É de suma importância que o Médico tenha conhecimento das alterações eletrocardiográficas características destas condições para que o diagnóstico seja estabelecido. A morte súbita em jovem, ocorrendo às vezes como manifestação inicial, é uma situação catastrófica, que somente pode ser prevenida com o diagnóstico e tratamento adequado.

SÍNDROME DE BRUGADA

Descrita inicialmente pelos irmãos Brugada em 1992, a sua prevalência não é bem conhecida, sendo mais comum em certos países da Asia, como Tailândia e Japão, onde constitui a principal causa natural de óbito em jovens.
Os pacientes acometidos são geralmente homens jovens, com coração estruturalmente normal e alterações eletrocardiográficas típicas: padrão de bloqueio de ramo direito (mas pode ser considerado um pseudo-BRD porque em geral na há a onda S alargada nas derivações esquerdas), supradesnivelamento do ponto J e do segmento ST nas derivações V1-V3.
A síndroem de Brugada é determinada geneticamente, com transmissão autossômica dominante, sendo ligada principalmente a mutação no gene SCN5A, o que causa disfunção no canal de sódio. Está associada a síncope e/ou morte súbita, relacionada a taquiarritmia ventricular maligna, geralmente taquicardia ventricular polimórfica auto-limitados ou que degenera para fibrilação ventricular. Os episódios mais comumente ocorrem em repouso e à noite durante o sono.
A morte súbita ocorre com a idade média de 41 ± 15 anos.
O padrão eletrocardiográfico característico da síndrome de Brugada pode sofrer modificações conforme pode ser registrado entre ECG sucessivos ou traçados de Holter, e pode tornar-se evidente após a administração de certas medicações, como antiarrítmicos do grupo I (bloqueadores dos canais de sódio) e nos quadros febris.
O implante de Cardiodesfibrilador geralmente é indacado para o tratamento da síndrome de Brugada, visando a prevenção da morte súbita cardíaca.
O mecanismo eletrofisiológico provável das alterações no ECG na síndrome de Brugada (supra de ST e inversão de T) diz respeito a presença de dispersão na repolarização através da parede ventricular. Há alteração no potencial de ação no epicárdio, de forma mais acentuada no ventrículo direito, sendo tais alterações ausentes no endocárdio, o que faz surgir um gradiente elétrico que se traduz pela alteração de ST-T observadas nas derivações precordiais direitas.
Além do padrão citado inicialmente, outros tipos de alterações da repolarização ventricular são reconhecidas, sendo classificados em três padrões básicos, conforme consenso de especialistas:

TIPO 1: elevação do ponto J e do segmento ST associado a onda T invertida. O segmento ST é convexo e apresenta elevação ≥ 2 mm em seu pico.
TIPO 2: supradesnível do ponto J e inicial do segmento ≥ 2 mm, seguido por depressão central (aspecto de “sela”). A porção terminal do ST tem amplitude ≥ 1 mm, sendo seguido por onda T positiva ou bifásica.
TIPO 3: supradesnível do ponto J e inicial do segmento ≥ 2 mm, seguido por depressão central (aspecto de “sela”). A porção terminal do ST tem amplitude < 1 mm, sendo seguido por onda T positiva.

Estes padrões podem ser observados no relato do segundo consenso (link nas referências).
Dentre os padrões citados apenas o tipo 1 permite estabelecer o diagnóstico de Brugada. Na presença do tipo 1 e 2, o diagnóstico é incerto e outros parâmetros devem ser considerados, como a história de síncope/morte súbita (pessoal e familiar) e realização de teste provocativo com drogas (ajmalina,flecainida, procainamida) para esclarecimento diagnóstico.
A colocação alta do eletrodo de V1 e V2 (no segundo ou terceiro espaço intercostal) tem sido descrito como capaz de revelar o padrão tipo 1 mesmo quando as alterações estão ausentes no ECG realizado com V1 e V2 em posição normal (quarto espaço intercostal).
Trataremos depois da síndrome do QT longo congênito e da síndrome do QT curto.

REFERÊNCIAS

1. Brugada P, Brugada J. Right bundle branch block, persistent ST segment elevation and sudden cardiac death: a distinct clinical and electrocardiographic syndrome. A multicenter report. J Am Coll Cardiol. 1992;20(6):1391-6.
2. Alings M, Wilde A. "Brugada" syndrome: clinical data and suggested pathophysiological mechanism. Circulation. 1999; 99(5):666-73.
3. Antzelevitch C, Brugada P, Borggrefe M, et al. Brugada syndrome: report of the second consensus conference: endorsed by the Heart Rhythm Society and the European Heart Rhythm Association. Circulation. Feb 8 2005;111(5):659-70. Disponível em: http://circ.ahajournals.org/cgi/content/full/111/5/659; acessado em 15 de março de 2011.
4.Yan GX, Antzelevitch C. Cellular basis for the Brugada syndrome and other mechanisms of arrhythmogenesis associated with ST-segment elevation. Circulation. 1999; 100(15):1660-6.

2 comentários:

  1. Sempre que faço um eletrocardiograma,o resultado dá:alteracoẽos da repolarização do tipo ventricular do tipo brugada em v1 e v2,nunca me disseram o que isto é, terei de me preocupar?

    ResponderExcluir
  2. Magnífica a explicação sobre a Síndrome de Brugada.

    ResponderExcluir