quinta-feira, 29 de março de 2012

O VALOR DAS DERIVAÇÕES PRECORDIAIS DIREITAS (V3R-V4R) E POSTERIORES (V7-V9) NO IAM INFERIOR


Como sabemos o ECG padrão é formado por 12 derivações, seis do plano frontal (I, II, III, aVR, aVL, aVF) e seis do plano horizontal (V1, V2, V3, V4, V5 e V6). Derivações adicionais podem ser empregadas em certas situações, como as precordiais direitas (principais: V3R, V4R)  e as chamadas derivações posteriores (V7-V9). V3 e V4R são úteis no diagnóstico do infarto do ventrículo direito, que habitualmente ocorre em associação ao infarto inferior. O infarto posterior (ou lateral, conforme a classificação de Bayes de Luna) geralmente ocorre também associado ao infarto inferior. O ECG exibe no infarto posterior depressão do ST nas derivações V1-V2 e aumento da amplitude da onda R nestas mesmas derivações. As derivações posteriores auxiliam no diagnóstico ao mostrarem o padrão típico (supra de ST e onda Q) quando há envolvimento da parede posterior. O supra que se revela nas derivações posteriores se apresenta em V1-V2 com infra de ST (imagem em espelho); da mesma forma, a onda Q observada em V7-V9 se expressa em V1-V2 como aumento da amplitude da onda r.
Como devem ser realizadas estas derivações? São derivações que não são realizadas de rotina no ECG. Então mudamos a programação do eletrocardiógrafo para manual e realizamos V1 ou V1-V2-V3 e colocamos os eletrodos nos pontos torácicos de cada uma destas derivações. Quando empregamos V1 o registro é feito uma a uma, já utilizando V1-V2-V3 registramos de forma simultânea três das derivações citadas As precordiais direitas são obtidas com os eletrodos exploradores no hemitórax direito, nos pontos simétricos a cada derivação precordial padrão. Por exemplo, V4R é obtida com o eletrodo explorador no quarto espaço intercostal direito, linha hemiclavicular. As derivações posteriores são obtidas com o (s) eletrodos explorador (es) nos pontos estabelecidos paras as respectivas derivações posteriores, a saber:
V7- ELETRODO EXPLORADOR NO QUINTO ESPAÇO INTERCOSTAL ESQUERDO, NA LINHA AXILAR POSTERIOR.
V8-ELETRODO EXPLORADOR NO QUINTO ESPAÇO INTERCOSTAL ESQUERDO, NA LINHA HEMICLAVICULAR POSTERIOR, ABAIXO DA ESCÁPULA.
V9-ELETRODO EXPLORADOR NA BORDA PARAVERTEBRAL ESQUERDA.


Em geral a realização de V4R, V7 e V8 é suficiente para o diagnóstico do comprometimento do ventrículo direito e da parede posterior. Como tanto o infarto do ventrículo direito quanto o infarto posterior ocorrem habitualmente associados ao infarto inferior, devemos realizar as precordiais direitas (V4R é a principal) e V7-V8 em todo paciente com infarto inferior. Nos eletrocardiógrafos onde podemos programar para realizar isoladamente V1-V2-V3, então se colocamos o eletrodo de V1 no quarto espaço intercostal direito, na linha hemiclavicular direita para realizar V4R, o eletrodo de V2 no quinto espaço intercostal, na linha axilar posterior esquerda (V7) e o eletrodo de V2 na linha hemiclavicular posterior esquerda, logo abaixo da escápula (V7) realizamos as três derivações citadas (V4R, V7, V8) de modo simultâneo. Realizando as três derivações, teremos a informação sobre a presença associada de infarto do ventrículo direito e de infarto posterior (V. FIGURAS).


ECG DE 12 DERIVAÇÕES

REGISTRO DE V4R-V7-V8, IDENTIFICADAS NO TRAÇADO COMO V1, V2 E V3, RESPECTIVAMENTE (DUAS SEQUÊNCIAS)
(Eletrocardiógrafo programado no modo manual para registro de V1-V2-V3)


O ECG de 12 derivações neste exemplo é compatível com infarto inferior em evolução, onda Q e corrente de lesão nas derivações D2-D3-aVF, já com regressão do supra de ST, conforme comparação com ECGs prévios. Há R amplo em V1, entretanto em V1 o padrão é rS, o que não permite o diagnóstico de infarto posterior.
O registro de V4R não evidencia infarto do ventrículo direito, porém V7-V8 apresenta onda Q de 0,04 s e supra de ST de 1 mm, o que sugere infarto posterior. Portanto, podemos afirmar que se trata de infarto ínfero-posterior.
Acrescento que a derivação V4R, além de apresentar boa acurácia para diagnosticar o envolvimento do ventrículo direito, pode nos fornecer informações sobre a artéria culpada. 
Conforme WELLENS, a análise do segmento ST em V4R permite a determinação da artéria culpada no infarto ínfero-posterior:


  • SUPRA DE ST EM AVR (INFARTO DE VD ASSOCIADO): LESÃO PROXIMAL DA CORONÁRIA DIREITA (CD);
  • AUSÊNCIA DE SUPRA DE ST E T POSITIVA: LESÃO DISTAL NA CD;
  • DEPRESSÃO DE ST: LESÃO CULPADA NA CIRCUNFLEXA (Cx).


Nesse caso, V4R mostra depressão de ST, e onda T bifásica. Com efeito o cateterismo cardíaco mostrou oclusão da artéria circunflexa.
Lembro que a artéria culpada no infarto inferior é a coronária direita em cerca de 80% dos casos.
Quando há supra de ST em aVR, diagnosticamos infarto de VD e lesão culpada proximal da CD, já que a irrigação do VD se faz por ramos proximais da coronária direita. Neste caso há maior possibilidade de bloqueio AV nodal pelo comprometimento do ramo que irriga o nó AV (que tem também origem na CD na grande maioria dos casos). O infarto do VD se manifesta clinicamente por hipotensão e por pressão venosa elevada, sem congestão pulmonar. O envolvimento do ventrículo direito no IAM inferior é associado a maior taxa de complicações e maior mortalidade hospitalar.


REFERÊNCIA:
Wellens HJ. The value of the right precordial leads of the electrocardiogram. N Engl J Med. 1999; 340(5):381-3.
Zehender M, Kasper W, Kauder E, el al. Right ventricular infarction as an independent predictor of prognosis after acute inferior myocardial infarction. N Engl J Med 1983; 328 (14): 981-8.


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